el cordobés (9)

CÓRDOBA (no relógio) – Não há frescuras no mundo do rali, mas há uma preocupação obsessiva com horários. Simples: todo mundo tem de cumprir uma programação. Hora para sair, hora para chegar ao posto de controle onde começa um estágio, hora para terminar, hora para começar o seguinte, hora para chegar de volta ao Parque de Serviço e, especialmente, hora para colocar o carro debaixo da tenda e de lá tirá-lo para começar tudo de novo. Cada segundo fora dos tempos e horários pré-estabelecidos representa punição. Em segundos. Como ganha aquele que cumprir todas as maluquices possíveis em três dias no menor tempo, cada segundo é tratado como ouro.

Então, almoço cedo. Fomos convidados pela Citroën. 11h30, não muito depois disso, porque Loeb e Sordo tinham de estacionar seus carros por volta das 12h30 e já estavam chegando. Entraram na área do Parque de Serviços enquanto eu mordia uma bisteca de porco e já estavam na fila de entrada dos “boxes” quando terminei o pudim. Notei que ao lado da porta da cozinha colocaram um mapa do rali. Todo mundo participa. O cozinheiro quer saber por onde seus pilotos e navegadores vão passar. A mocinha de relações-públicas, também. Todos vibram quando sabem que os meninos voltaram à base sãos e salvos.

Do lado de fora, os mecânicos apenas esperavam. Já sabiam, porque os pilotos contam pelo rádio, tudo que seria preciso fazer nos carros. Em meia hora. Nem um segundo a mais. Meia hora para arrumar os carros que chegam do meio do mato completamente arrebentados, sujos e detonados. Os pilotos são sádicos. Trazem seus brinquedos de volta sem pedaços da carroceria, com paralamas e spoilers quebrados, radiadores furados, assoalhos partidos.

É preciso arrumar tudo. E em meia hora. Por isso, peças, componentes e ferramentas já estavam a postos. Em todas as equipes. Cada carro tem um horário diferente para entrar na sua tenda. Em cada tenda, um cronômetro grande marca o horário de entrada, o horário de saída e faz uma contagem regressiva. Isso nos times mais chiques, como a Citroën. Outros, como a Suzuki, anotam os horários num cartaz, com caneta hidrocor, e colam o papel debaixo de um relógio de parede.

O carro de Loeb, finalmente, aponta lá no fim da faixa de asfalto. Vem devagar. O público, aglomerado nas grades, diante das tendas de cada equipe, quer autógrafos, acenos, carinho. Os pilotos dão. Os assessores das equipes saem de dentro das tendas a cada meia hora cheios de bonés nas mãos e vão distribuindo ao pessoal. Uma festa.

Menos para os mecânicos. Loeb estaciona, o cronômetro dispara em contagem regressiva. Um fiscal da FIA fica de bituca. Pode trocar tudo no carro, menos o motor. Os caras levantam o carro em cavaletes e cada um sabe exatamente o que fazer. Mal conversam. Um arranca as rodas, outro começa a trocar o freio, outro troca a suspensão, outro solda o cárter, outro troca o pára-choque, outro remenda a carroceria com “silver-tape”, outro limpa o barro.

O cronômetro não pára. Loeb já saltou do carro e foi para a tenda onde almoçamos para comer alguma coisa. Tem meia hora para comer, escovar os dentes e fazer xixi. Todo mundo trabalha feito louco. O chão dos “boxes” daria nojinho nos mecânicos da F-1, que trabalham em ambientes que se parecem com salas de cirurgia.

Há lama, barro e água por todos os cantos. Os mecânicos se enfiam debaixo dos carros sem o menor pudor. Se sujam todos. O cronômetro não pára.

Loeb judiou de seu C4. Faltam 30 segundos para o tempo terminar e ele sai da tenda, com o macacão ainda arriado. O carro vai ao chão. Loeb abre a porta e se acomoda no banco quando faltam 12 segundos para zerar o cronômetro. Dá a partida, engata a ré e sai da tenda. Os mecânicos refizeram seu carro em meia hora. E ainda sobraram 8 segundos.

O carro está limpinho e tinindo. Pronto para mais não sei quantos estágios, acho que cinco, programados para toda a tarde. Seb, como o chamam, está preocupado. Mikko Hirvonen, líder do campeonato, fechou a manhã com quase um minuto de vantagem para ele.

Vou ver as outras equipes.

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Pe. Antonio Vieira
Pe. Antonio Vieira
16 anos atrás

O barulho é similar ao que se ouve em consultório de dentistas.

sergio
sergio
16 anos atrás

Não me lembro em que ano, mas durante uma “especial” na etapa do México, a dupla Loeb/Elena sofreu um pequeno acidente e a suspensão a traseira esquerda foi para o saco com roda e tudo. Especial perdida, só restava tentar voltar ao parque fechado para ver o que se conseguia fazer. E lá foram os dois, Loeb dirigindo e o Elena após baixar o vidro da sua porta sentou ali, com o corpo para fora do carro, tentado fazer um pendulo para aliviar o peso no lado oposto. Quando pegaram uma auto estrada – é óbvio que com o transito normal – após alguns quilometros, foram parados por uma dupla da Policia Rodoviaria à bordo de uma Corvette. Os policiais já sairam do carro dando risada dos dois – Loeb/Elena- e após alguns minutos de negociação com direito à mandar uma foto do carro infrator via celular à Central, eles foram liberados para seguir. E lá se foram eles de volta ao seus postos. Loeb ao volante, Elena pendurado na porta como se estivesse velejando e atrás dois policiais à bordo da Corvete mais “bandida” que já vi como escolta, e que não paravam de rir pela solução encontrada por aquela dupla de gringos malucos.
Tudo isso passou num programa que tinha no canal AXN da Sky chamado Shakedown com um reporter inglês muito engraçado.
Hoje só nos resta A ESPN que mais passa comercial de outras coisas durante o período do programa do que propriamente sobre a etapa do raly em si.

Gomes
Gomes
16 anos atrás

É verdade. Eu mesmo coloquei adesivos da Pirelli em todos os carros e passei a noite pintando os pneus. Fui eu também que estendi todas as faixas pelos 352 km do rali e pelo Parque de Serviço. Eu trabalho direito. E você notou que estou sendo parcial? Que não citei nenhuma outra marca de pneu que participa do WRC? Oh, preciso melhorar nesse aspecto.

Paulo
Paulo
16 anos atrás

FG, no seu trabalho “jornalístico”, inclui jabás descarados da Pirelli, ou seja, sempre dá um jeitinho do logotipo da marca aparecer em uma foto. E ainda diz que a cobertura é imparcial …

RAFAEL JORGENS
RAFAEL JORGENS
16 anos atrás

Amigo Gomes, garota bonita a da foto.
Manda um beijo pra ela.
Fui …

Aliandro Miranda
Aliandro Miranda
16 anos atrás

Cara, que show de cobertura! Quero uma assim da F-1, já te disse…

dado andrade
dado andrade
16 anos atrás

FG voce colocou tanto carinho e adimiracao com este tipo de competicao que passei a pensar sobre a formula 1.Da maneira que esta e uma %!$&#!!!

MSM
MSM
16 anos atrás

È necessário pontualidade britânica para seguir os horários e não ser punido. Pontualidade britânica na Argentina?