AH, TÁ… (1)

Pobre Pérez: batida com quatro minutos de treino

SÃO PAULO (histórico, épico, gigante!) – Começo com uma explicação. Fiquei horas (mentira, minutos) pensando no título criativo da série de posts sobre o GP da Hungria. Nesses quase 18 anos de blog, já devo ter feito quase tudo usando as variações de Buda, Peste, Hungaroring, Magyar etc. e tal. Acabei chegando no brilhante “Ah, tá…” que pode ter infinitas interpretações, mas na verdade é só uma brincadeira com ATA.

“Ah, tá…”, dirá alguém sem entender nada e fingindo que está entendendo. À explicação, pois.

ATA é a sigla para Alternative Tyre Allocation, a patacoada da semana na F-1. Trata-se de um formato de alocação de pneus (alternativo, claro) que a categoria deveria ter testado em Ímola, mas como não teve corrida lá ficou para Budapeste. Consiste, basicamente, em dois pilares. O primeiro, reduzir de 13 para 11 a quantidade de jogos de pneus para cada piloto por GP. O segundo, estabelecer para a classificação a obrigatoriedade de uso de pneus duros no Q1, médios no Q2 e macios no Q3.

Segundo a Pirelli, a Liberty, a ONU e a Greta Thunberg, a redução fará com que sejam usados no fim de semana 160 pneus a menos do que em GPs sem ATA. A conta não é muito difícil: 13 (jogos) x 4 (pneus) = 52, 52 x 20 (pilotos) = 1.040; enquanto 11 x 4 = 44, 44 x 20 = 880; 1040 – 880 = 160. De acordo com as entidades acima, tal economia de borracha significaria um aumento de sobrevida para a humanidade de 14 segundos em mil anos, e considerando-se uma temporada de 24 corridas, como no ano que vem, nós, humanos, ganharíamos 336 segundos na conta que se encerra no dia e na hora marcados para o fim do mundo, o que dá quase seis minutos de lambuja para a gente fazer o que quiser.

Economia de pneus: vamos salvar o mundo

Por outro lado, e é preciso ponderar sempre os dados estatísticos, a economia de pneus reduz drasticamente o tempo de pista dos mesmos 20 pilotos nos treinos livres, já que eles precisam poupar borracha nova para os momentos mais decisivos do fim de semana, a saber: classificação e corrida. Institutos renomados de pesquisa calcularam que essa redução de atividade nas sextas-feiras da F-1 pode afastar 38,4 milhões de telespectadores da TV no referido dia da semana, fazendo com que esses 38,4 milhões resolvam passear com seus carros de rua no mesmo horário, ocasionando um gasto de borracha 137 mil vezes maior do que o necessário para produzir 160 pneus de carros de corrida.

Sendo assim, o bônus que a humanidade ganharia até o fim de mundo com a não produção de 160 pneus de F-1, de quase seis minutos, cai drasticamente e reduz nossa sobrevida neste planeta em 18 horas e 23 minutos, o que é uma barbaridade. Não acho justo perder 18 horas e 23 minutos da minha vida por causa de pneus de F-1, sinceramente.

Assim, espero que a ATA seja revista.

“Ah, tá…”, dirá alguém de novo sem entender nada, mas fingindo que está entendendo tudo.

E quem parece não estar entendendo nada, mesmo, é Sergio Pérez. É ele quem aparece lá no alto, na foto que abre esta postagem. E acima, no tuíte do perfil da F-1. Para quem não viu o primeiro treino livre, cedinho aqui no Brasil, foi o seguinte. Com quatro minutos de treino, Pérez saiu dos boxes e na curva 4 meteu a roda traseira na grama e estampou seu carro na barreira de pneus na curva subsequente, apropriadamente chamada de 5.

Na hora, a TV mostrou esse moleque com camiseta da AlphaTauri chorando na arquibancada. Podia ser qualquer coisa. O pai não quis comprar um sorvete. Foi picado por um besouro húngaro. Acabou a bateria do celular. Queria voltar para casa. Viu uma foto do Rosemiro, do Palmeiras, no telão. Mas foi interpretada pelas boas almas da F-1, sua cara de choro, como um lamento pela batida do mexicano. Ignorou-se o fato de que sua camiseta era de outra equipe — portanto, supõe-se, o menino torce para Tsunoda e De Vries, ou Ricciardo, qualquer um desses; pode ser também que essa fosse a camiseta mais barata na lojinha do autódromo, ou a única disponível em tamanho infantil, talvez o moleque não tivesse a menor ideia de onde estava, queria mesmo era jogar PlayStation. Seja como for, ficaram todos comovidíssimos com o menino e o levaram aos boxes da Red Bull para conhecer Pérez, e aí é que deve ter chorado, mesmo.

Pode-se dizer que a panca de Checo foi a única coisa relevante da sexta-feira em Hungaroring, uma vez que a chuva e a ATA embaralharam os resultados e é muito difícil tirar alguma conclusão sobre desempenho de quem quer que seja. O acidente aconteceu no início do primeiro treino, e quando a sessão pôde ser retomada, começou a chover. Apenas 13 pilotos registraram tempos. Russell fez a melhor volta, em 1min38s795.

Pérez está em parafuso. Desde o GP de Miami, em que largou na pole e foi humilhado por Max Verstappen (nono no grid e vencedor da corrida), amarga uma sequência de cinco ausências do Q3 e um mísero pódio, contra cinco poles e cinco vitórias seguidas do companheiro de equipe. Há a sombra de Daniel Ricciardo, que hoje voltou a ser titular na AlphaTauri, no lugar de De Vries. O australiano anda dizendo aos quatro ventos que sonha em retomar seu cockpit na Red Bull.

Pérez assumiu o erro, agradeceu ao mecânicos, que conseguiram reconstruir seu carro em tempo de participar do segundo treino, mas é evidente que seu estado emocional está em farrapos e que a paciência da equipe com ele está chegando ao fim. Pérez é, hoje, uma espécie de Santos: tem camisa, mas corre sério risco de rebaixamento.

Os tempos do segundo treino: nenhuma conclusão

Dito isso, eis aí o resultado do segundo treino livre, já no seco, com muitas nuvens no céu. Russell, o primeiro no TL1, foi o último no TL2. Verstappen ficou em 11º. Tsunoda, em quarto. Hülkenberg, em sexto. Alfa Romeo, em sétimo e nono. Faz algum sentido? Nenhum, quando se sabe quanto andam esses carros e pilotos. Todo, quando nos lembramos, de novo, da ATA.

“Ah, tá…”, dirá alguém mais uma vez sem entender nada, mas fingindo que está entendendo tudo.

Ocorre que a Mercedes, por exemplo, usou apenas um jogo de pneus médios para cada piloto. Verstappen também guardou pneus novos para amanhã e domingo. Mal conseguiu experimentar as mudanças no carro da Red Bull, que alterou os sidepods calculando ganhar 0s2 por volta com o novo desenho. Não dá nem para esculhambar Ricciardo, em 14º. Nunca tinha andado com o carro da AlphaTauri, o pior do grid, e ainda precisou economizar borracha.

Leclerc fechou o dia com o melhor tempo e Norris foi o segundo. A McLaren, que foi muito bem em Silverstone, vai andar bem de novo na Hungria, então? Não sei. O próprio piloto disse hoje que o ponto fraco do carro atualizado são as curvas lentas, que abundam no circuito magiar. Piastri terminou em 19º, para não me deixar mentir. A verdade dessa corrida só saberemos amanhã, na classificação. Não levem muito a sério os tempos de hoje. Não dizem muita coisa.

O grid para a corrida de Budapeste será definido a partir das 11h. O texto de hoje atrasou, mas o “Fórmula Gomes”, no YouTube, começa pontualmente às 19h. Nos vemos lá.

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14 Comentários
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Marcos Alvarenga
Marcos Alvarenga
9 meses atrás

Com 336 segundos dá pra dar uma rapidinha nem tão rapidinha assim. Barba, cabelo. Bigode, não.

Doravante, estou em consonância com a tal da ATA.

Edu Zeiro
Edu Zeiro
Reply to  Marcos Alvarenga
9 meses atrás

Barba e cabelo dá para fazer na sequência, é verdade, na mesma tesourada.

MARCIO HENRIQUE MARTINS DE REZENDE
MARCIO HENRIQUE MARTINS DE REZENDE
9 meses atrás

Putz, lembrar do Rosemiro, me fez dar muita risada… Coitado era de assustar mesmo…

lagerbeer
lagerbeer
9 meses atrás

Que chatos ! Então é melhor pedir à Pirelli para que nesse contrato de renovação com a F1, que a próxima geração de pneus sejam construídos de bambu reciclável

Edson Asfora
Edson Asfora
9 meses atrás

Perfeito! 🎯

Formiga
Formiga
9 meses atrás

A tá…

Carlos Sato
Carlos Sato
9 meses atrás

Aproveitando o Ah Tá…
Todo final de semana de corrida, a Pirelli leva ´varios jogos de pneus para chuva (intermediários e chuva extrema) que são prontamente descartados após a corrida. Grande economia de borracha, e grande esforço para promover a sustentabilidade…Ah Tá…
O que isso geou de fato. Menos carros na pista, o que é ruim para a categoria em si, e para o público que acompanha a F1.
E não vai mudar em nada a ordem das forças na categoria. Equipes maiores sempre terão vantagem, ainda mais nesses tempos de testes limitados. Sem poder rodar, as equipes menores não coletarão dados suficientes, e possíveis atualizações ficarão pelo caminho.
Uma pena.

Celio Ferreira
Celio Ferreira
9 meses atrás

Nossa Checo…que FAAASEEEE…

Marcus
Marcus
9 meses atrás

Para o GP da Hungria do ano que vem, você pode colocar “Lingua do Diabo” como título. É uma referência ao livro “Budapeste”, do Chico Buarque. Ele escreveu que, de todas as línguas, se uma foi criada pelo diabo, é o húngaro.

Last edited 9 meses atrás by Marcus
Vai Vettel!
Vai Vettel!
9 meses atrás

Eu ri muito nos parágrafos da ATA, dos pneus, do garoto e do Pérez! Você iria ganhar um bom dinheiro se escrevesse textos para humoristas.

TYRRELL
TYRRELL
9 meses atrás

O menino estava triste porque o pai não quis comprar fatia húngara para ele rs

Igor
Igor
9 meses atrás

Uma sugestão para o ATA em vez de tirar os pneus: tire uma ou duas corridas dessa temporada quilométrica do ano que vem.

Celio Ferreira
Celio Ferreira
Reply to  Igor
9 meses atrás

Concordo em gênero , numero e grau

Igor grein
Igor grein
Reply to  Celio Ferreira
9 meses atrás

Eu gosto de assistir f1. Quanto mais corrida melhor.