CATAR COQUINHO (3)

SÃO PAULO (tem corrida demais, eu falo…) – Essa aí em cima é a zebra da discórdia, que levou a Pirelli a determinar, agora há pouco, que cada piloto poderá completar no máximo 18 voltas com um jogo de pneus no GP do Catar. Isso significa que todo mundo está obrigado a uma estratégia de pelo menos três paradas na corrida. Quem pensava em uma ou duas, esquece. Serão no mínimo três, e pronto.

Claro que tal decisão torna absolutamente artificial a prova de daqui a pouco. Escrevi aqui ontem que isso teria pouca relevância, pelas circunstâncias desse GP: título decidido ontem, festa para Verstappen, elogios para Piastri etc.

Errei. Não se pode minimizar o que está acontecendo, como fiz na última postagem. Tem relevância, sim. Porque ainda que seja uma corrida que não valha muita coisa, ela tem de ser levada a sério. E equipes e pilotos levam. Quem não está levando a F-1 a sério, neste momento, são a FIA e a Liberty. A primeira, por ser negligente naquilo que é sua obrigação: fiscalizar com rigor os palcos de seus espetáculos; a segunda, porque não tem o menor pudor em marcas corridas em qualquer lugar, desde que paguem bem.

O que levou a Pirelli a esse alerta das 18 voltas foram essas zebras aí em cima. A combinação de dois fatores está levando os pneus ao risco de colapso. Primeiro, a extensão das faixas de zebras, que levam os carros a permanecerem muito tempo sobre elas. São desnecessariamente enormes, causando vibração excessiva nas carcaças dos pneus. Depois do primeiro e único treino livre do fim de semana, eles foram analisados pela fornecedora e apresentaram microrrachaduras nas laterais. O segundo fator é a construção dessas zebras, que estão sendo chamadas de “piramidais”. Elas se elevam de dentro para fora da pista, com um vinco criminoso no topo. São feitas, aparentemente, para rasgar pneus.

Disse ontem na minha live no YouTube, e repito hoje. Não há necessidade de padronização de zebras em todos os circuitos. Cada pista tem uma característica, cada curva tem um raio, uma velocidade máxima, um ponto de tangência. As necessidades são, por assim dizer, individuais. Assim, podemos ter, claro, zebras diferentes de um circuito para outro. O que não pode, em hipótese alguma, é permitir uma construção que ofereça perigo a equipamentos e pilotos. Lembro de umas zebras malucas em Interlagos anos atrás, instaladas como se fossem salsichas colocadas uma do lado da outra perpendicularmente à pista. Feitas para quebrarem suspensões. Foram banidas no ano seguinte.

Zebras tinham, originalmente, a função de “devolver” um carro à pista nas saídas de curva, pelo lado de fora. Eram inclinadas e, do ponto de vista físico, devolviam mesmo. Por dentro, serviam como ponto de orientação para tangências. Com o tempo, foram sendo aprimoradas e passaram a delimitar o leito carroçável de um circuito no caso de traçados muito planos. Algumas mais altas, outras mais baixas. Umas mais inclinadas, outras menos. E ao redor do mundo podem ser encontradas feitas em diversas formas, cores, materiais e dimensões. Mas cada caso é um caso. Engenheiros existem para isso, para conceber essas estruturas de forma que elas cumpram determinada função sem oferecer risco a ninguém. Fiscais da FIA, idem. Devem vistoriar o que é proposto e aprovar, ou não.

Como é que alguém pode ter autorizado o uso dessas lâminas de concreto em Lusail? Quem foi a besta quadrada que inventou esse formato? Ele é inaceitável em qualquer situação, para competições de carros, motos, charretes ou patinetes. Nada que possa cortar um pneu tão fácil e obviamente pode ser instalado numa pista de corridas.

Dessa forma, o GP do Catar está comprometido desde já. O absurdo de uma obra porca e inaceitável determinou as estratégias para todas as equipes. Vinte pilotos vão largar numa pista que pode parecer segura, com suas enormes áreas de escape, mas no fundo é perigosíssima porque, simplesmente, tem zebras que podem rasgar a borracha sobre a qual estarão acelerando a 300 km/h.

Tenho cá minhas teorias para explicar episódios como esse. Uma delas é a da ganância. A F-1 está aceitando correr em qualquer canto — Arábia Saudita, Catar, Las Vegas, Miami — sem a mínima preocupação com o esporte em si. É meio clichê, mas é igualmente fato: vale a grana. O resto que se dane.

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Renan Moura
Renan Moura
7 meses atrás

Flávio ta aqui um que gosta de ler kkkk
Vc disse ontem no Pari live q ninguém lê seu blog kkkk.
To aqui pra cobrar! Cade o “Depois de ontem” com os quadrinhos coloridos???? ><

Quanto ao GP foi muita insanidade…
Infelizmente R$ compra tudo… e vai ter corrida lá por um bom tempo….

Diego Gomes
Diego Gomes
7 meses atrás

Essas zebras bizarras também já foram colocadas em Jerez, FG.

O que não entra na minha cabeça é que as zonas de escape de brita começaram a ser substituídas pelo asfalto, a contragosto dos pilotos sobre quatro rodas, supostamente para maior segurança dos motociclistas. Só que para acabar com a subsequente farra de pilotos usando o escape de asfalto como se fosse pista, surgem tais ‘soluções’ assassinas, como essas zebras ou as supracitadas ‘salsichas’ (que já vitimaram Abbie Eaton na W Series há uns anos). Como diabos um motociclista caindo da moto e deslizando sobre essas joças seria mais seguro do que sobre a grama?

Enfim, saudades dos tempos em que os ‘limites de pista’ eram brita e grama, e os pneus não eram fabricados para gastarem rápido de propósito. Essa prova está longe de ser a única coisa ‘artificial’ na F1 atual…

Pedro Ewald
Pedro Ewald
7 meses atrás

Aparentemente fizeram as zebras inspiradas na bandeira do país. Ficou ó… uma bosta.

Patrick
Patrick
7 meses atrás

Há muitos anos ao ler alguma notícia fiquei estarrecido ao ler sobre a “arquitetura hostil” cuja existência eu só sabia de ver aquelas grades que os bancos colocavam nas fachadas, aqui na minha cidade, para evitar que pessoas se sentassem. Agora vejo essa zebra… Não querem mendigos lá na pista, só pode.

Edison
Edison
7 meses atrás

Como uma pista com essas zebras passou na vistoria? Absurdo

lagerbeer
lagerbeer
7 meses atrás

Sei bem o que é isso … aqui nas ruas da Vila Gumercindo tá cheio dessas “zebras piramidais”, além de uns buracos, e outros “obstáculos” … haja suspensão, freios e pneus … os mecanicos e borracheiros agradecem

WRC
WRC
7 meses atrás

Arrebentaria até meus 245/70R16. Nunca vi nada tão horrível no automobilismo. Outra: 6 meia dúzia de homens consertariam tais zebras durante a madrugada e tudo estaria certo para corrida.

Paulo Dantas Fonseca
Paulo Dantas Fonseca
7 meses atrás

Como pode a FIA autorizar uma corrida com uma pista fora das especificações de segurança, essas zebras servem com um trampolim para eventuais graves acidentes. Simplesmente lamentável.

Celio Ferreira
Celio Ferreira
7 meses atrás

FG falou tudo…sem comentários

Sanzionovisk
7 meses atrás

A impressão que tenho é que o problema nem é tamto pela zebra ser em formato de pirâmide, mas sim por ela acabar num corte seco, formando pontas.
Isso aí é bisonho demais. Até o carinha que varre a pista olho e imaginou que fosse dar merda.

Chupez Alonso
Chupez Alonso
7 meses atrás

Pelo menos não deu zebra no campeonato.

E hoje perdi a viagem.

Iria assistir à corrida na casa da Lu.

Mas a Lu saiu.

Pelo menos me enviou essa foto.

Os últimos 10 títulos mundiais reunidos.

Em breve serão 15…

Vou guardar a foto.

Rumo ao 8cta!

IMG_4669.jpeg
Last edited 7 meses atrás by Chupez Alonso
O crítico
O crítico
Reply to  Chupez Alonso
7 meses atrás

Pobre pessoa, essa lady baba. Até somar não está sabendo… É deslumbre demais e raciocínio de menos…