RED BULL & PORSCHE: FEITO

SÃO PAULO (sem mais) – Está feito. Ontem pingou a notícia, a partir de um site holandês, que Porsche e Red Bull registraram no Marrocos o acordo que revela como será a parceria entre a montadora alemã e a equipe de F-1. A Porsche vai comprar metade do time que pertence à fábrica de bebidas energéticas.

O site do Conselho de Concorrência do Reino de Marrocos, onde o documento foi protocolado, está aqui, com versões em árabe e francês. Mas vou facilitar a vida de todo mundo, porque a procura é árdua para quem não fala árabe fluentemente — por isso que para mim foi fácil, inshalá! O documento registrado no órgão regulatório, em PDF, pode ser consultado aqui, em francês. São essas duas folhinhas reproduzidas aí em cima.

Resumidamente — aliás, o documento é bem resumido mesmo, e já explico o que Marrocos tem a ver com essa história –, as duas partes informam que serão realizadas duas operações. A primeira prevê a criação de uma nova empresa, uma joint-venture entre a alemã Porsche e a austríaca Red Bull GMBH (a firma-mãe, que faz as latinhas) cuja principal atividade será a de fabricar motores para a Red Bull Technology Ltd. na Inglaterra — a empresa responsável pela operação da equipe no Campeonato Mundial de Fórmula 1, cujas ações pertencem integralmente à Red Bull GMBH.

A segunda operação prevê a aquisição, pela Porsche, de metade da Red Bull Technology — a equipe — junto à Red Bull GMBH. Em outras palavras, a Porsche vai ser sócia da Red Bull para fabricar e desenvolver chassis para uma das equipes que pertencem à companhia austríaca. Portanto, a AlphaTauri está fora dessa negociação.

O comunicado sobre essas operações foi recebido pelas autoridades marroquinas em 8 de julho e elas foram aprovadas no dia 21. Se alguém se opuser à negociação, tem de se manifestar em dez dias úteis a partir da publicação do comunicado — ou seja, até 4 de agosto.

O Marrocos, agora. Pode parecer estranho que um país aparentemente alheio a uma negociação entre uma empresa austríaca e outra alemã precise ser avisado sobre ela. Mas é bem comum. Se as partes envolvidas atuam comercialmente em seu território, precisam comunicar as autoridades locais sobre esse tipo de movimentação. Red Bull e Porsche têm negócios no Marrocos — vendem, respectivamente, energéticos adocicados e belos automóveis. Todos os países da União Europeia, por exemplo, já sabem o que pretendem fazer Red Bull e Porsche. Apenas não deram com a língua nos dentes.

Aconteceu algo parecido, por exemplo, no Brasil quando a Disney comprou a Fox. A aquisição foi feita nos Estados Unidos. Mas as duas empresas tinham operações aqui e precisaram informar ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) sobre as negociações. E tiveram, também, de comunicar os países onde atuavam separadamente — quase todos da América Latina.

No Brasil, inicialmente, o Cade mandou a Disney vender o Fox Sports para que não se configurasse uma concentração indesejada de transmissões esportivas. Como não apareceu comprador, o Cade foi novamente consultado e acabou autorizando a fusão entre os canais — sem impor condições que protegessem seus funcionários, mas essa é outra história. Cada país tratou a questão de uma maneira. Na Argentina foi de um jeito, na Colômbia de outro, e no México, Chile, Equador… Onde houvesse ESPN (que pertence à Disney) e Fox Sports convivendo, algum modelo de fusão/aquisição/extinção teria de ser aprovado pelos órgãos responsáveis.

Os órgãos reguladores de atividades comerciais — como fusões e aquisições entre grandes corporações — de vários países são avisados sobre essas operações quando elas estão em andamento. Na maioria deles, os documentos são mantidos sob proteção e só se tornam públicos quando as decisões são tomadas. Esses órgãos analisam as operações e cada país decide se vai autorizá-las ou não em seus territórios em função de suas regras antitruste específicas. Mas a legislação do Marrocos prevê que as decisões do Conselho de Concorrência sejam publicadas. Por isso os termos gerais e resumidos da negociação entre Porsche e Red Bull acabaram vindo à tona.

E é isso. Não há grandes mistérios. É verdade que Red Bull e Porsche adorariam manter tudo em segredo até o dia em que decidissem fazer um rumoroso e bombástico anúncio oficial. Mas as regras marroquinas, que não se pautam pela discrição, acabaram com a farra.

Assim, preparemo-nos para conviver com a Porsche-Red Bull nos próximos anos. Ou Red Bull-Porsche. O nome ainda está em sigilo e não precisa ser registrado no Marrocos.

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Hilton Vaz Pezzoni
Hilton Vaz Pezzoni
1 ano atrás

É exatamento por textos assim que eu leio Flavio Gomes. Desde a coluna Motor na Folha, há um 1/4 de século. Grazie tanti !

eduardo
eduardo
1 ano atrás

Agora vem a Red Bull de Air Cooled 6 cilindros.

Zé Maria
Zé Maria
1 ano atrás

Fabricar e desenvolver chassis…
Não seriam motores!

Zé Maria
Zé Maria
Reply to  Flavio Gomes
1 ano atrás

O ignorante aqui, num raciocínio raso e superficial, imaginou que, em sendo Porsche e Red Bull Technology sócias igualitárias na empreitada, ficando cada uma responsável por metade do pacote, caberia aos alemães cuidar do trem de força, enquanto a turma das latinhas (Adrian Newey) se incumbia de projetar a condução.

Robson
Robson
Reply to  Zé Maria
1 ano atrás

Segundo o texto Porsche e Red Bull criarão uma terceira companhia (join venture) para desenvolver os motores e a Porsche ao comprar metade da Red Bull F1 trabalharia na produção do bólido, ou seja, do chassi.

Edu Zeiro
Edu Zeiro
1 ano atrás

Beleza, vou ter de pensar qual será minha relação com a Porsche a partir de agora (como se isso fosse ser de importância capital para eles). Mas, sobre a parte prática, essas operações passam a valer quando, desde já, a partir do próximo ano ou quando mudarem os motores? Vai ser só F1 ou prevê volta a Le Mans e à WEC? Ou ainda está cedo para saber?

José Fernandes
José Fernandes
1 ano atrás

Caramba, por qual motivo as pessoas não leem uma matéria completa? Seria algum tipo de transtorno? Que tristeza..

Bruno
Bruno
Reply to  José Fernandes
1 ano atrás

Quando o texto foi postado, ele não estava completo, por isso que eu e outros fizemos perguntas cujas respostas, posteriormente, apareceram no texto, fazendo com que pareçamos ter algum tipo de transtorno…

SAI
SAI
1 ano atrás

Fazia mais sentido na minha cabeça a Audi comprar a AlphaTauri. Não esperava de forma alguma essa sociedade Porsche-StierRot. Contudo, quando a Porsche perguntou quanto valia a RedBull, olhou pro seu cheque e viu que dava pra fazer uma proposta ~conjecturando~.
Gosto bastante de ambas as marcas e espero muito sucesso.

Agora me diz, Flavinho. Por que diacho isso foi protocolado em MARROCOS (não responda. É brincadeira com os comentários anteriores)

Glaucio Branco
Glaucio Branco
1 ano atrás

Flavio, quando surgiu esta noticia.. achei que era “pegadinha” / “fake news” / “espuma” / etc… uma vez que falava em Marrocos.. (que é que este pais teria haver com Porsche (alemã) e RedBull (Austriaca) ?????? ).

Mas seu texto, para variar, é um primor de clareza . inclusive com links para as fontes..

Dá prazer em ler até o final :D

AXÉ

Igor
Igor
Reply to  Glaucio Branco
1 ano atrás

Parece que “haver” foi incorporado oficialmente à língua no lugar de “a ver”.

Glauciobranco
Glauciobranco
Reply to  Igor
1 ano atrás

Obrigado, sinceramente, pela correção do português.

Last edited 1 ano atrás by Glauciobranco
ba-7
ba-7
1 ano atrás

Mas, Flavio, por que a autoridade do Marrocos teve de intervir no caso? A joint-venture será sediada lá (para efeitos, talvez, fiscais)?

ba-7
ba-7
Reply to  Flavio Gomes
1 ano atrás

Opa, agora sim! Valeu!

Gui Martins
Gui Martins
1 ano atrás

Eita. Big deal. Mas que diacho o Marrocos tem a ver com isso, né?

Alex
Alex
1 ano atrás

Boa tarde.

Algum motivo especifico pro acordo ser em Marrocos?

Achei, de verdade, bem interessante.

Robson
Robson
Reply to  Flavio Gomes
1 ano atrás

Texto curto, elucidativo, mas as pessoas não leem.

Bruno
Bruno
1 ano atrás

Marrocos? Alguém sabe o porquê desse acordo ter sido assinado lá?

Bruno
Bruno
Reply to  Flavio Gomes
1 ano atrás

Quando comentei, assim como outros aqui, não constava a explicação no texto, ainda. Agora sim, li tudo está perfeitamente explicado, obrigado.