BAKU NA MÃO (2)
SÃO PAULO (melhor que ontem) – Fez uma bela pole-position em Baku o ferrarista Charles Leclerc. Com o tempo de 1min41s356, o monegasco larga na pole pela sexta vez no ano, em oito corridas. São quatro poles seguidas. E 15 na carreira. Ele terá a seu lado na primeira fila amanhã, na largada para o GP do Azerbaijão, o mexicano Sergio Pérez. Atrás deles, pela ordem, Verstappen e Sainz. Ferrari, Red Bull, Red Bull, Ferrari. Daí sai o vencedor da prova, se nada de excepcional acontecer no planeta neste domingo. Oh, não diga.
Um grid sem grandes novidades, pois, exceção feita ao líder do campeonato, que volta a largar atrás do companheiro de equipe. Que, por sua vez, anda colocando o pescocinho para fora do engradado, como se diz. Pérez reclamou que a equipe não lhe deu um vácuo na volta final, como teoricamente tinha sido combinado. “Falamos disso mais tarde”, disse-lhe o engenheiro pelo rádio. E ainda se queixou da falta de potência plena em seu motor. “Falamos disso mais tarde”, repetiu o engenheiro.
Não é a primeira vez que Checo reclama com o time. Foi assim em Barcelona, de forma veemente durante a corrida que ele jura que poderia ter vencido. A resposta é sempre “falamos disso mais tarde”. Bem feito para Pérez. No México, você vai a um restaurante, faz o pedido, demora pra cacete, e quando reclama o garçom diz: “¡Ahorita mismo!”. E continua demorando pra cacete. O “ahorita mismo” dos mexicanos é terrível. São os maiores procrastinadores do planeta.
Dias depois do queixume na Catalunha, Pérez ganhou em Mônaco. Está num momento melhor que Max. Pode-se dizer que pela primeira vez, desde que assumiu um carro titular na Red Bull, o holandês vem enfrentando uma disputa interna forte. Pode ser circunstancial. Mas é o tipo de coisa que abala pilotos acostumados a andar na frente de seus parceiros. A expressão aborrecida de Verstappen ao fim da classificação não nega.
A sessão que definiu o grid em Baku começou às 18h15 locais com 15 minutos de atraso, porque uma batida na corrida da F-2, horas antes, atrasou a programação toda. Foi preciso reconstruir uma mureta de proteção. O horário é inusitado, perto do anoitecer. E com temperaturas bem mais baixas do que na hora da corrida. Ao pôr-do-sol, 24°C, com apenas 34°C no asfalto. A prova, amanhã, começa às 15h locais (8h de Brasília) com previsão de sol e calor, temperaturas esbarrando nos 30°C e mais de 45°C na pista, o que muda muito as coisas em termos de acerto de carro e de
No último treino livre, Pérez foi o mais rápido, antecipando o duelo entre Red Bull e Ferrari que vem sendo a marca deste fim de semana — e, de resto, da temporada. Disputa, diga-se, que tem garantido alguma diversão na pista. No Q1, seus pilotos se revezavam na primeira colocação até Lance Stroll, a 2min30s do final, bater e provocar uma bandeira vermelha. Àquela altura, Verstappen era o mais rápido com 1min42s722 e Pérez vinha colado nele, a 0s011. Leclerc e Sainz apareciam na sequência e Vettel era a surpresa do momento, em quinto, com outro “outsider” entre os primeiros — no caso, Zhou em sexto.
Quanto o Q1 foi retomado, muita gente ainda tinha o que fazer para tentar se garantir na fase seguinte da classificação. Formou-se um congestionamento na saída dos boxes com enorme potencial de dar merda — e ninguém conseguir melhorar coisa nenhuma. Bottas, em 17º, era o mais angustiado com a iminente degola.
Boxes abertos, 14 pilotos foram à pista numa zona federal. O tráfego dificilmente permitiria grandes façanhas. E elas, de fato, não aconteceram — ok, Gasly subiu para quinto, merece uma menção. Bottas se safou por pouco e conseguiu melhorar seu tempo, subindo para 15º. Ufa. Foram eliminados Magnussen, Albon, Latifi, Stroll e Schumacher. Albon, pelo rádio, fez um pronunciamento acusando Alonso de tê-lo atrapalhado de propósito. Meio exagerado. Receio que Alonso nem tenha percebido sua presença pelo retrovisor.
O Q2 começou da mesma maneira, com Verstappen fazendo 1min42s227 logo de cara, Pérez colando nele, e na sequência a dupla da Ferrari saltando para primeiro e segundo — Sainz na frente, 1min42s088, com Leclerc grudado a 0s094. O quinto colocado, Gasly, estava mais de 1s atrás. Pouco depois, Checo foi o primeiro piloto do fim de semana a baixar de 1min42s: cravou 1min41s955 com garbo e elegância e retomou a ponta para a Red Bull. Charlinho se aproximou e fechou o segmento em segundo. Norris, Ricciardo, Ocon, Zhou e Bottas encerraram suas atividades e foram trocar de roupa mais cedo.
McLaren e Alfa Romeo, com os dois carros fora do Q3, decepcionaram um pouco. Pela primeira vez no ano o chinês bateu o finlandês. Agora, Sainz é o único piloto na temporada que perdeu todas as disputas de grid para o companheiro. Vettel e Alonso, veteranos de outros carnavais, passaram e se juntaram às duplas de Red Bull, Ferrari, Mercedes e AlphaTauri no Q3.
Na fase decisiva, Sainz chutou o pau da barraca imediatamente, fazendo uma voltaça em 1min41s814 e trazendo com ele, muito perto, o companheiro Chaleclé — 0s047 atrás. Pérez e Verstappen ficaram em terceiro e quarto — o mexicano de novo na frente do holandês cada vez mais emburrado com a petulância do parceiro. Mal falamos da Mercedes, né? Pois falemos. Russell e Hamilton seguiam saltando na pista. “Perigosamente”, de acordo com Lewis. “Alguém vai ter de fazer alguma coisa, não poderemos ficar mais quatro anos guiando carros assim”, protestou Jorginho. Tem um fundo de razão, embora seja justo dizer que algumas equipes já resolveram o problema do “porpoising” e o time alemão, ainda não.
A segunda bateria de voltas rápidas mostrou que Charlinho é, atualmente, o grande poleman da categoria. Trucidou o tempo de Sainz, virando 1min41s356, 0s455 melhor que o companheiro. O espanhol ainda seria superado por Pérez e Verstappen, que se colocaram entre as duas Ferrari no grid. Checo foi 0s282 mais lento que o monegasco; Max, 0s347. Carlos errou em sua segunda tentativa e ficou em quarto, mesmo. Russell, Gasly, Hamilton, Tsunoda, Vettel e Alonso fecharam o grupo dos dez primeiros.
Leclerc largou na primeira fila em todos os GPs deste ano. Ganhou dois, apenas. Em ritmo de corrida, a Red Bull vem sendo mais forte. Na prova de amanhã, a Ferrari precisa provar que não faz espuma só no sábado. As últimas quatro etapas foram vencidas pelo time dos energéticos, que consegue administrar melhor o desgaste de seus pneus. E eles, os pneus, serão decisivos em Baku. É prova para duas paradas, no mínimo.
Farei um prognóstico arriscado, ousado, corajoso, quase insolente para amanhã: Pérez e Verstappen vão deixar de sorrir um para o outro ao final do GP azerbaijano — ou azeri, como queiram. Max vai tentar engolir o parceiro nas primeiras voltas. Quiçá na largada. Com alguma agressividade. Suspeito que na solidão de seu travesseiro, hoje à noite, ele decida matar a cobra no ninho. O menino não está gostando nada de ver seu reinado rubro-taurino ameaçado. Não era dentro de casa que ele esperava encontrar resistência na luta pelo bicampeonato. Mas a ameaça, hoje, está justamente no box ao lado.
Quem diria.