MEU, BURN! (1)
SÃO PAULO (é tudo verdade) – Aqui se faz necessária uma explicação. E não estou inventando. Como é de conhecimento amplo e irrestrito, Felipe Massa é um sujeito muito querido na F-1 e conversa com todo mundo. Paulistano, embora tenha sido criado na perifa de Botucatu, onde era conhecido como “Maffinha da Fumaffa” (vivia para cima e para baixo com uma motoca dois tempos que fazia muita fumaça; a maldade infantil levou ao apelido no qual “ss” e “ç” foram substituídos por duas duplas de “f” por conta da língua presa do garoto, que nem é tão presa assim, a do Romário é bem pior, o deputado chamou o presidente da CBF de “fafado” e o da Fifa de “fem-vergonha”), tem trejeitos linguísticos muito comuns aos moradores da metrópole. O fato é que Massa usa a interjeição “meu” para tudo. “Meu, o carro é muito rápido!”, “Meu, o Alonfo é um pé no faco!”, “Meu, o motor Merfedes é muito bom!”. Todo mundo em São Paulo fala “meu”, não é privilégio do piloto, diga-se. Eu mesmo falo muito, em geral quando alguma coisa dá errado: “Meu, fodeu”. Toda hora falo.
Pois bem, esse tique de linguagem acabou se espalhando pelos pilotos da F-1 e todos eles, sempre que encontram com Felipe, dizem “meu”. É uma brincadeira interna, nem todo mundo sabe disso. Assim, quando Alonso encontrou com ele em Jerez falou, em espanhol: “Meu, usted és un rabudo, este motor Mercedes és muy bueno!”. Já no Bahrein, Rosberg comentou em inglês: “Meu, your hair is very nice this winter, which conditioner are you using? It’s won-der-ful!”. E Domenicali, o ex-chefe na Ferrari, desabafou em italiano: “Meu, questo cazzo de Kimi non parla niente!”.
Daí o título da série de posts que vos acompanhará durante este fim de semana de GP da Austrália, que ao contrário do que vocês imaginam não é um trocadilho infame e sim uma referência técnica ao carro da Red Bull.
Calma, explico.
Numa daquelas noites etílicas no Bahrein, Massa encontrou Vettel debruçado no balcão do bar diante de uma garrafa de Martini bianco. Sorriu para o amigo, ergueu a taça que tinha um caroço de azeitona dentro e saudou o brasileiro já tecendo algumas considerações sobre o vermute, em inglês. “Meu, it’s fucking sweet, but it’s good and cheap”, avaliou. Felipe sentou-se e perguntou o que estava acontecendo, afinal. Então, Sebastian se abriu: “Meu, [the fucking engine never works, overheats and] burn [everything]!”.
Quando nós jornalistas colocamos essas palavras entre colchetes, é que elas nem sempre foram ditas realmente. O interlocutor quis dizer, ou ocultou uma ou outra, entendem? A gente usa para contextualizar declarações resumidas. Se você pergunta: “A bosta do seu motor não funciona, superaquece e queima tudo?”, o piloto, obviamente, vai responder: “Sim, queima”. Quando você vai escrever, não reproduz a pergunta. Apenas a resposta. Mas não faria sentido escrever algo como “Sobre o motor, Vettel disse: ‘Sim, queima'”. Queima o quê? O condensador? As bobinas? A junta do cabeçote? A rosca? A boa redação exigiria algo como “Sobre o motor, Vettel confirmou os problemas da Renault com uma declaração curta e definitiva: ‘Sim, [aquela bosta não funciona, superaquece e] queima [tudo]'”.
Entenderam?
Pois a frase de Vettel dita a Massa no boteco barenita foi precisamente essa: “Meu, burn!”, em tom choroso e desconsolado. Coincidentemente, a frase, em termos fonéticos, se assemelha à pronúncia de “Melbourne”, onde está começando a temporada. Mas não tem nada a ver uma coisa com a outra, se a corrida fosse em Adelaide a série teria o mesmo título, dada a relevância da afirmação do tedesco rubrotaurino.
Dada esta breve explicação, que espero não ter-vos aborrecido, vamos ao primeiro treino livre que acabou de acabar. E não se acostumem mal, vai ser a primeira e última vez no ano em que escreverei sobre primeiro treino livre. Voltaremos à doce rotina de resumir o dia a partir da próxima etapa do campeonato. É que este era importante, para saber como iriam se comportar equipes, carros, pilotos e pais-de-santo na abertura oficial do Mundial mais diferente do anterior de todos os tempos.
Fiz algumas observações pontuais. A elas:
– Deu muito orgulho do meu Laika, do meu Niva, do Meianov, da minha perua Lada, do meu TL, da minha Variant, do meu Karmann-Ghia, do meu Corcel II, do meu Passat Surf e do meu Golzinho batedeira, hoje. Todos eles, afinal, têm motores iguais aos da F-1, 1.600 cc. OK, nenhum deles é turbo, nem tem acoplado outros motores elétricos que recuperam a energia que vem das profundezas do inferno. Mas pelo menos funcionam. Algo que hoje não aconteceu com Hamilton, por exemplo. Aos 6 minutos de treino, o inglês saiu dos boxes e antes de fechar a volta sua unidade de força foi para o saco.
– Lewis não tirou o capacete até chegar ao escritório da Mercedes e ainda foi barrado na catraca por um segurança que deve ter achado que aquele cidadão fantasiado de piloto estava tentando dar um aplique. O inglês quase engoliu o homem. Perdeu 90 minutos de treino. É ruim, isso.
– Na Red Bull, notei que em determinado momento Adrian Newey entrou debaixo do carro de Vettel e perguntou: onde foi mesmo que eu coloquei as baterias? Até descobrir, uma hora se passou. O tetracampeão andou apenas na meia hora final da sessão. Ficou em sétimo.
– Muitos telespectadores devem ter estranhado o ronco dos novos motores. Ronco, no caso, é termo que se aplica com precisão. Os motores do ano passado berravam, gritavam, urravam, eram estridentes e chiliquentos. Esses novos lembram Homer Simpson dormindo. Roncam. Emitem um som grave, gutural e desanimado. Dão a impressão de que vão quebrar a qualquer momento, ou de que algum cilindro não está funcionando. Me remetem à saúde dos motores da potente Towner. Se meu carro de corrida começa a fazer um barulho semelhante, eu vou para os boxes. Mas acho que vamos acabar nos acostumando. Os pilotos, pelo menos, não precisam gritar tanto pelo rádio.
– Foi só com 47 minutos de treino que a primeira volta foi cronometrada, de Ricardão: 1min37s290.
– Com metade da sessão completada, apenas 11 carros tinham voltas fechadas. Metade do grid. A Caterham já tinha avisado pelo Twitter que Koba-mito tivera um problema de alimentação de combustível e Marcus Celular Baratinho Sem Android estava às voltas com uma pane elétrica.
– Na Williams, Massa esperava pelo conserto de alguma coisa que não sei o que era, e só conseguiu entrar na pista faltando meia hora para o fim, mas andou rápido logo de cara e fechou a sessão em quarto. Como Sapattos foi terceiro, está na cara que a equipe tem um bom carro e nisso ninguém errou.
– Foram 16 os pilotos que fecharam voltas. Entre os que nem apareceram na folha de tempos estavam os dois da Lotus. Pastor Bem Danado [com a cagada de ter trocado Williams pela Lotus] chegou a sair dos boxes, mas voltou na banguela sem motor. Grojã ficou dentro do cockpit até faltar um minuto para terminar o treino, quando um mecânico enfiou algo no bico esquisito que parecia um motorzinho de dentista. Pelo sim, pelo não, o francês pulou fora.
– Alonso foi o mais rápido, com 1min31s840, usando pneus médios. Foi cerca de 4s mais lento que Vettel em 2013, no primeiro treino livre para a corrida australiana do ano passado. Os tempos ainda devem baixar bastante. Bonitton ficou em segundo, a dupla da Williams veio a seguir e o resto vocês veem no Grande Prêmio.
Tirei alguma conclusão? Sim, de que vou precisar de um café bem forte para segurar o sono. Dormir entre as duas sessões é morte certa. E não sei colocar essa caixinha para gravar. Tenho saudades do meu videocassete.
Ah, no novo projeto gráfico dos posts de finais de semana de GP, desenvolvido por um escritório de design de Barcelona, vou colocar uma foto grandona no fim do texto. Decidimos assim depois de uma pesquisa com os leitores. Perguntamos a dois deles o que achavam de uma fotona no fim. Um respondeu “tanto faz”. Outro disse que nunca chegava ao fim dos textos. Assim, decidimos pela foto.
Até já.
O Massa está limpando a nariz na foto???
FIA em festa! “Nando Pilantra” em primeiro!
Nao sei se alguem ja comentou (se ja o fizeram, perdao pela repeticao), mas o ponto legal desses novos motores eh que da para ouvir os pneus “cantando” nas freadas mais bruscas ou derrapadas, coisa que eu nunca havia ouvido em na F1.
Texto excepcional. Analisa, informa, diverte e ensina. Uma aula de redação jornalística. Bravo!
O melhor momento foi o segurança na roleta achando que o Hamilton era um Zé Qualquer tentando mandar um “somebody-love” pra entrar nos boxes…
hahaha com certeza! Algo engraçado aconteceu com Vettel em 2012, quando chegou na aduana do Canadá, o fiscal pediu pra ele o que ele ia fazer no país, Vettel respondeu que foi por causa da corrida. “E conseguiu um bom lugar?” perguntou o fiscal. “Sim, dentro do carro, sou piloto” respondeu o Tião. hahaha
Ri muito! kkk… Vc dormiu com o bozo e acordou engraçadinho[goz…dinho]?!
Sensacional o texto…..a explicação pro meu, burn! foi muito boa…..
Agora, falar que o Felipe Massa é um sujeito muito querido e conversa com todo mundo na F1, foi pra inventar essa história neh???
Não posso falar dele no meio da F1 pois nem lá convivo, mas as poucas vezes que o vi em kartódromos, ele é de uma estrema arrogância…podia ser um dia que acordou com os cornos virados, mas a postura dele não muda…
Flavio, não sabia que vc tem uma TL!!! Posta uma foto dela um dia desses!!!
Estou restaurando a minha, 4p 1973, com uma pitada de Porsche aqui e ali, hehehehe!!!
Um TL.
Meu, texto muito bom, nem precisa de foto mas ficou bacana.
Flavio, adorei a citação de orgulho com relação aos seus carros 1.600cc. Será que eu teria chance com a minha Brasilia ? =)
Muito bom! Rachei de rir da história de onde surgiu o “Meu, Burn”. Puta criatividade.
Meu, me amarrei no seu texto!
Essa temporada será demais!
Abs!
na minha opinião o som piorou nas acelerações e melhorou nas freadas, é bom para ver as corridas na madruga sem acordar a mulher.
Beleza, Flavio, delícia de percepção, texto, informações -até pata leigos como eu- etc. Já tenho por onde acompanhar a temporada sem ter que ouvir a gritaria e presepadas. Abraços, divirta-se. E divirta-nos.
Nada contra o barulho dos novos motores, até achei legal. Prefiro os graves aos agudos. Além do que agora se pode ouvir os pneus cantando.
Flavio, só uma pergunta: O motor do seu Karmann Ghia é 1600? não seria 1500?
O ronco dos motores estão mais pra “furadeira de impacto com os rolamentos do induzido detonados”.
Caro Gomes, os trocadilhos que você usa em fim de semana de corrida são legais. Uns mais, outros menos, mas acabam sendo legais, já nos habituamos a eles.
Mas por favor, pelo amor dos deuses, jamais volte a explicar um trocadilho. A choldra penhoradamente agradece.
Muito bom “ver” a Formula-1 de novo… mas esta meio insosso “ouvir” a F-1… nessas horas temos quer dar razão para o Tio Bernie… o ronco dos motores não empolga nada.
Boa sorte para a Renault nesse final de semana.
Imperador.
Burn tambem e um concorrente da Red Bull
Meu, muito engraçada sua matéria, ce tava inspirado, a historia do Mafa é da hora demais, puta coincidência essa do Meu, Burn!!!
Rachei o cano de rir, valeu,
Abçs
Marcelo
Putz…. te xinguei pra c…. ler tudo aquilo pra nós fazer entender o meu, burn! Eh ruim demais, e por isso é muito bom….
O ronco do motor realmene ficou muito diferente, com excecao da ferrari, parece uma mistura de motor de moedor de cana com autorama
Ficou irado a foto….
Sugestão construtiva: O texto esta engraçadinho demais, cansativo de ler. Virou brincadeira de pular paragrafo.
Ótimo, não leia.
Massa se lascou agora no 2o. treino, ou estava escondendo o jogo?
MEU, BURN, genial kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
Duas observações:
– A Williams não eh tao boa quanto pensavam;
– Massa ta com cara de quem vai levar do companheiro de equipe. A ver.
Vai ser difícil se acostumar com o som desses motores, eu que sempre assisto f1 e de vez em quando assistia a indy o que mais me chamava a atenção era o som dos motores deles que eram bem mais tranquilos, agora não vejo muita diferença entre os dois. Até os ônibus piso baixo daqui de SP fazem mais barulho que esses v6.
Outra coisa que vou ter que aprender é quantas unidades de força cada carro desse tem e pra que servem, agora é unidade térmica, unidade elétrica, ers, pedalo, vapor…
Dorgas. Fó pode. Fe fe fe…
Caraca! O que tinha no seu guaraná?? kkk….Sobre o som dos motores, até que achei legal o barulhinho do turbo…Sim, acho que vamos nos acostumar com eles, pode escrever ai…Abraço!
Fala Flávio… dormir entre os treinos é morte certa! Belas palavras… e olha que eu ainda tenho prova 7h da manhã! Mas fazer o que… … queria eu gostar de futebol… horarios mais acessíveis e jogos praticamente todos os dias…
Enfim, só um comentário… não sei hein… mas parece que me agradou o ronco desses V6… Você nao gostou nada nada?
Abs!
Parece uma Towner.
Towner é foda. Mas parece mesmo.
Seu novo BR800 deve ter ronco mais bonito.
Meu filho Victor de 8 anos começou assistir comigo o primeiro treino e me perguntou que categoria era… Chorei de dar risada…
A gente vai assistir do mesmo jeito, mas o ronco tá uma m…
Eh flavio
vi o fox sports radio hj pela primeira vez
e seu destaque inicial foi sensacional….
e o post do blog tb
abraços
Coitado do Lito aguentando o Sérgio Mauricio que elogiou umas 10 vezes o ronco lixo dos motores desse ano… puxa-saquismo total! Nem o Bernie gostou, tá na hora de chutar a bunda da FIA!
O Lito mesmo falou que agora têm som de carro de corrida! O_o
Sobre o treino, nada tenho a comentar, pois você já disse tudo e um pouco mais. Fico constrangido com o cara do SporTV, o Sérgio Maurício. Fala muita besteira sempre, mas hoje se superou: arranjou um “tetra” para o Senna…3 títulos nas pistas e 1 no Sambódromo!!! Pode isso?
O Sergio Mauricio é muito ruim mesmo!!! E seus bordões então nem se fale… No Capricho!!! éérrr
Burn, Flying Horse, TNT, …
Impressão minha ou os pneus estão gritando bem mais?
Também escutei uns pneus cantando hoje.
Provavelmente não dava pra ouvir antes por causa do motor…
Em Adelaide 1986, na perseguição de Piquet a Rosberg, dava para ouvir os pneus cantarem nas curvas (esquinas). Realmente, aparentemente, o cantar dos pneus estava sendo abafado pelo “grito estridente” [dos motores]. Então volto a repetir… estão fazendo barulho (literalmente) por nada. Na década de 80, tão saudosa, o som dos motores, 1500cm3 turbo, portanto MENORES que estes de hoje, não devia ser tão diferente. E ninguém reclamava…
E não era José!
É que a grande maioria que acompanha hoje, só viu a F1 pela primeira vez depois de 90… Quem é mais matuza como nós, sabe que o ronco dos motores da primeira era turbo eram parecidíssimos com os atuais… a diferença é que, se não me engano, existiam saidas duplas e os atuais, é uma única saída…
Certíssimo amigo! realmente o som é bem parecido com o dos anos 80 o detalhe é mesmo a saída de escape que antes eram duas, o som dos carros dos anos 70 era ainda mais baixo quem viu o Emerson em 2010 em interlagos deve se lembrar, aquele barulho estridente acabou viciando muita gente e concordo com vocês muitos não assistiram a boa e nostálgica fórmula 1 dos anos 80!
mas e os motores da Matra? aqueles gritavam que era uma maravilha! E o som era bonito, sim…
O barulho dos Matra eram magníficos mas só assisti em vt pois a Matra saiu no fim de 72 lembro também dos Alfa Romeo do fim dos anos 70 quebravam muito mas o barulho arrepiava abç!
A Matra forneceu seus famosos V12 para a Ligier de 76 a 78.